sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Análise de Conjuntura: Geografia do Esporte – Sávio Raeder

Caros(as) Amigos(as):

Uma das propostas do Blog é que ele se torne um espaço de troca de idéias acerca de nossos temas de pesquisa. É nesse sentido que inicio a reflexão sobre o meu tema de pesquisa: a Geografia do Esporte. Minha intenção é realizar análises de conjuntura sobre a relação entre práticas esportivas e processos espaciais com um enfoque nas políticas públicas empreendidas neste campo. Considerando meu interesse especial pelos megaeventos esportivos, minhas análises deverão ser direcionadas para as dinâmicas espaciais no contexto da formulação, execução e avaliação destes eventos.

Tenho a intenção de publicar essas análises de duas em duas semanas às sextas-feiras.

Espero que essa iniciativa inspire-os a também escreverem sobre seus temas de interesse e que essas análises possam contribuir para o desenvolvimento institucional do PPGG.

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Nesta primeira quinzena do ano a Copa das Nações Africanas, que estão ocorrendo em Angola, se destacou pela repercussão do ataque terrorista ocorrido em Cabinda. O ataque, ocorrido antes do início da Copa, foi promovido pelo por uma dissidência do grupo separatista Forças de Libertação do Estado de Cabinda (FLEC) contra o ônibus da delegação da seleção de Togo.

Este trágico evento lança luz sobre duas questões que envolvem o megaevento esportivo:

1) A visibilidade promovida pelos Jogos é utilizada tanto por governos como por grupos que buscam modificar as relações de dominação vigentes nos territórios que ocupam. Há eventos similares na história dos Jogos, destacando-se o ataque empreendido pelo grupo palestino Setembro Negro à delegação israelense nos Jogos Olímpicos (JO) de Munique em 1972. Por outro lado, se observa o esforço dos governos em se promover os Jogos como meio de projetar a imagem de uma potência, sendo os JO de Berlim 1936 e os de Pequim em 2008 exemplos dessa estratégia;

2) Como resposta à possíveis ataques, os países destinam cada vez mais recursos do orçamento dos Jogos para investimentos na área de segurança. São criados espaços de circulação restrita e outros passam por vigilância acirrada a título de se evitar o uso do megaevento como vitrine para grupos que, por meio da violência, buscam novas relações de dominação em seus territórios. Isso foi observado nos Jogos Pan-americanos do Rio de Janeiro em 2007 que investiu aproximadamente meio bilhão de reais em segurança. Isso está em curso nos preparativos para os JO de Londres em 2012 com a adoção de novas tecnologias de segurança que possam evitar um possível ataque terrorista.




Em relação a outros eventos no exterior, cabe nota para dois fatos. O primeiro refere-se ao fato de que pode faltar neve para os JO de Inverno que ocorrerão em Vancouver (Canadá) no próximo mês. Não se trata exatamente de algo surpreendente em se tratando de uma das menos frias sedes já escolhidas para a edição de inverno dos JO. O segundo tem uma tênue relação com primeiro, mas destaca-se por outra razão. Trata-se da candidatura de Barcelona aos JO de Inverno de 2022. Barcelona é famosa por ter sediado em 1992 os JO de verão promovendo uma grande reestruturação urbana, fato que inspirou muitas administrações a buscarem os Jogos como estratégia de revitalização de suas cidades (o Rio de Janeiro é o exemplo mais evidente de sua influência na América Latina). A estratégia de Barcelona pode estar relacionada com a necessidade de atualização de sua imagem no cenário internacional. Além de Barcelona, Munique também se apresenta como uma candidata aos JO de Inverno, porém para os de 2018, tendo sido antes sede de uma edição de verão (1972). É possível que em tempos de aquecimento global estas cidades encontrem dificuldade climáticas para realizar estes eventos, ainda que os eventos que exijam neve sejam realizados em cidades próximas.

Outro tema relevante desta quinzena foi o anúncio dos investimentos públicos para os preparativos da Copa de 2014. Foram anunciados cerca de R$ 20 bilhões, sendo boa parte destinada às obras de infraestrutura das 12 cidades sedes. O montante se divide da seguinte forma, segundo o anunciado até agora:
R$ 11,2 para mobilidade urbana (sendo R$ 7,6 bi da União e o restante dos Estados e Municípios)
R$ 4,8 bi para estádios (via empréstimos do BNDES)
R$ 2,5 bi para ampliação de aeroportos
R$ 1 bi para ampliação da rede hoteleira
R$ 700 milhões para reforma de terminais turísticos em portos

As sedes da Copa do Mundo em 2014 serão: Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Cuiabá, Curitiba, Porto Alegre, Salvador, Fortaleza, Manaus, Natal e Recife.

Se cumprido o planejamento de investimentos anunciado, as cidades sedes da Copa receberão um aporte considerável de recursos para qualificarem suas estruturas urbanas. Além disso, tais investimentos devem ser realizados em prazos bem definidos a fim de que as estruturas estejam finalizadas até a realização do evento. Se por um lado passou ao largo dos agentes decisores a preocupação com a organização do futebol nas cidades escolhidas, por outro percebe-se que foram selecionados os principais centros urbanos do país. Ou seja, se por um lado os estádios construídos ou reformados correm o risco de se tornarem obsoletos após a Copa, por outro os investimentos em infraestrutura podem beneficiar justamente áreas com maiores demandas por modernização de seu território.

Quanto ao Rio de Janeiro, verifica-se que algumas políticas estão sendo orientadas tendo como marco o ano de 2016 para a sua implantação. O decreto do Governados Sérgio Cabral determinando que todos os ônibus intermunicipais tenham ar condicionado até 2016 é uma delas. Já no campo da formação de uma agenda de políticas públicas, o IPEA lançou um estudo apontando para a possibilidade de o Brasil erradicar a pobreza extrema em 2016. Por outro lado, uma polêmica envolvendo a liberação do gabarito para a construção de um prédio da Eletrobrás de 44 andares nas proximidades dos Arcos da Lapa coloca em questão a priorização da revitalização da área portuária. Anunciado como um legado dos JO de 2016, o projeto Porto Maravilha poderia receber um impulso com a construção deste prédio na zona portuária. A polêmica com a descaracterização do patrimônio seria evitada e o discurso da recuperação portuária poderia avançar concretamente.

2 comentários:

  1. Brasil!
    Bem, "ganhamos as Olimpíadas", quer dizer, o direito de sediar os Jogos. Mas o que o povo ganha? Propina não ganha. E nem deveria...

    Sávio, acho que teu trabalho é pertinente e lembro-me do que eu disse no meu blog assim que o resultado da sede dos jogos saiu. Os jogos não são a salvação da cidade e nem devemos acreditar que o modelo de Barcelona deve ser repetido ou se repetirá como em um passe de mágica... Minha grande questão com os Jogos é a maneira pelo qual julgam-no como uma entidade salvadora e que geradora de desenvolvimento automático para todos equitativamente. Tudo bem, eu sei, isso é o discurso político. Qual é a nossa tarefa?
    Observar, analisar e investigar as obras e intervir nas políticas estruturantes. Lutar
    por justiça social e melhor qualidade de vida e que estas sejam as verdadeiras prioridades das três esferas do poder executivo, legislativo e judiciário republicanos.

    Acho que é isso de início.
    abrços a todos

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  2. É... Barcelona sede de jogos de inverno... Se tanto nos inspiraram.... Podemos peleitear os jogos de inverno daqui a algumas décadas. Vai que o aquecimento global nos dá uma ajuda?

    Brincadeiras à parte, isso evidencia o jogo político capitalista de estratégias dos lugares.

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